Bispa Sonia Hernandes, líder e fundadora da Igreja Renascer
em Cristo / Foto: Divulgação
Fundadora da igreja evangélica Renascer em Cristo, Sonia
Hernandes, atende por mês cerca de 100 mulheres pedindo ajuda para sair de uma
situação de violência doméstica. “Elas nos procuram no altar com os olhos
roxos, hematomas nos braços e nas pernas e relatando ameaças de morte por parte
dos maridos”, diz Sonia ao Universa, do portal UOL.
Bispa Sonia, como é conhecida, diz ter criado um grupo de
advogados voluntários para orientar essas mulheres. Ela também pretende
implementar em suas igrejas o projeto Tempo de Despertar, aplicado na
ressocialização de homens agressores. O programa, que hoje funciona em fóruns
de Justiça de São Paulo, promove tratamento psicológico e grupos de conversa
para homens, na tentativa de diminuir a reincidência das agressões.
O Tempo de Despertar deve ser expandido para outras duas
igrejas evangélicas e uma congregação católica. Sem saber como fazer uma
denúncia, com medo do marido ou de serem, injustamente, culpadas por destruir a
família ao fazer uma queixa, muitas vítimas encontram na igreja a tábua de
salvação, e nos líderes religiosos aqueles que vão lhes dizer o que devem
fazer. Para Sonia, muitas denominações falham nesse trabalho. “Sei que há
instituições religiosas, e não só evangélicas, que fazem a mulher aceitar se
calar. Isso arrebenta a vida delas”, diz.
Sonia já foi um dos grandes nomes do movimento neopentecostal
no Brasil. Depois de um período reclusa e outro detida, voltou a público com a
eleição de Jair Bolsonaro, de quem é próxima — esteve ao lado do presidente na
posse e na Marcha para Jesus, em 20 de junho.
Ela e o marido, Estevam Hernandes, fundaram a Renascer em
1986 e chegaram a ter 1.200 templos (hoje são cerca de 400). A igreja entrou em
derrocada por volta de 2002. Uma série de acusações criminais foram golpes
duros. Em 2012, o casal foi absolvido do crime de lavagem de dinheiro pelo
Supremo Tribunal Federal por causa de um erro na acusação.
Igrejas dizem para não denunciar – A negligência em casos de
violência é tão recorrente, que lideranças religiosas e associações têm
instruído, de maneira prática, seus integrantes a ouvir e ajudar as vítimas.
O Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic),
que reúne as igrejas Católica, Luterana, Anglicana, Batista, Presbiteriana e
Ortodoxa, divulgou um comunicado no dia 22 de junho direcionado a pastores,
padres e reverendos: “Parem de aconselhar a mulher que é agredida fisicamente
pelo marido a orar e esperar em Deus; mandem ela ir até uma delegacia denunciar
o covarde. Do contrário, vocês são cúmplices do crime”. “Ainda há muitos
religiosos que aconselham as mulheres a se calarem para ‘salvar o casamento’,
mas é preciso que eles tomem consciência de que, quando pedem para a mulher não
denunciar o marido agressor, podem, na verdade, estar assinando o atestado de
óbito da vítima”, diz a secretária-geral da Conic, Romi Bencke.
Outra denominação evangélica, a Igreja Apostólica da Fonte,
também se dedica ao tema e realizou, no dia 6 de junho, a conferência
“Empoderadas em Deus”, para falar sobre violência doméstica. “O fator religião
pode confundir a vítima, que pensa duas vezes antes de denunciar pelo medo de
desmantelar a família, um pilar fundamental na igreja”, afirma Rúbia de Sousa,
autointitulada bispa. “Tentamos mostrar que essa culpa não é dela e a
encaminhamos para psicólogas.”
Foi com uma referência à Bíblia que a pastora de uma igreja
evangélica respondeu ao pedido de ajuda da dona de casa M. D., 27 anos, quando
ela contou que era espancada pelo marido. “Os humilhados serão exaltados”,
disse a religiosa, que ainda orientou M. a jejuar, passar sete madrugadas
orando e “aguentar as humilhações” do agressor. “Ele me dava tapas no rosto, me
chamava de vagabunda, já me empurrou da cama e disse que ia passar a faca em
mim. Pedi ajuda para essa líder e fiz o que ela disse, mas não resolvia. Estava
morrendo por dentro”, conta M.
Ela ouvia que não deveria se separar e que tinha que ser
forte e aguentar as explosões de raiva do marido, mesmo que ele a agredisse
fisicamente. “Um dia, ele me segurou pelo pescoço dizendo que ia me matar. Em
seguida, contei para a minha irmã, que chamou a polícia. Fui então levada a um
abrigo para mulheres vítimas de violência doméstica”, diz M., que hoje que mora
em Rondônia, em uma casa de acolhimento para mulheres agredida. “Depois que me
separei, ninguém da igreja me procurou para saber como eu estava, pois eles são
contra o divórcio.”
*Fonte: Universa – UOL