Crianças em busca de comida (Foto: Reprodução)
Quase uma em cada nove pessoas sofreu de desnutrição crônica
em 2019, uma proporção que deve se agravar com a pandemia de coronavírus –
aponta um relatório anual da ONU divulgado na semana passada. De acordo com as
últimas estimativas, no ano passado, a fome afetava quase 690 milhões de
pessoas, ou seja, 8,9% da população mundial, relata o documento da Organização
das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), redigido com a
colaboração do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola, o Fundo das
Nações Unidas para a Infância (Unicef), o Programa Mundial de Alimentos e a
Organização Mundial da Saúde (OMS).
Isso representa 10 milhões de pessoas a mais que em 2018 e
60 milhões a mais que em 2014. “Se a tendência continuar, estimamos que, até
2030, esse número excederá 840 milhões de pessoas. Isso significa claramente
que o objetivo (erradicar a fome até 2030, estabelecido pela ONU em 2015) não
está no caminho certo”, declarou à AFP Thibault Meilland, analista de políticas
da FAO.
E isso sem contar o choque econômico e de saúde provocado
pela pandemia do coronavírus, que causou perda de renda, aumento dos preços dos
alimentos, interrupção das cadeias de suprimentos, etc.
De acordo com o relatório, é provável que a recessão global
causada pelo novo coronavírus leve à fome entre 83 e 132 milhões de pessoas a
mais. “Ainda são hipóteses relativamente conservadoras, a situação está
evoluindo”, observa Meilland.
A estimativa de subnutrição no mundo é muito menor do que
nas edições anteriores: o relatório do ano passado mencionou mais de 820
milhões de pessoas com fome. Mas os números não podem ser comparados: a
integração de dados recentemente acessíveis – em particular de pesquisas
realizadas pela China em residências no país – levou à revisão de todas as estimativas
desde 2000. “Isso não é uma queda (no número de pessoas que sofrem de
desnutrição), é uma revisão. Tudo foi recalculado com base nesses novos
números”, insiste Meilland.
“Como a China representa um quinto da população mundial,
esta atualização tem consequências importantes para os números globais”, aponta
o analista da FAO. “Mesmo que o número global seja inferior, a constatação de
um aumento da desnutrição desde 2014 se confirma”, acrescenta.
Custo da má alimentação – Entre os
pontos de melhoria, a prevalência de atraso de crescimento entre crianças de
cinco anos caiu um terço entre 2000 e 2019, com cerca de 21% das crianças
afetadas em todo o mundo. Mais de 90% delas vivem na Ásia ou na África.
Além da desnutrição, o relatório aponta que um número
crescente de pessoas “teve que reduzir a quantidade e a qualidade dos alimentos
que consome”.
Assim, dois bilhões de pessoas sofrem de “insegurança
alimentar”, ou seja, não têm acesso regular a alimentos nutritivos em qualidade
e quantidade suficientes, indica.
São ainda mais numerosos (3 bilhões) aqueles que não têm
meios para manter uma dieta considerada equilibrada, com, em particular,
ingestão suficiente de frutas e legumes. “Em média, uma dieta saudável custa
cinco vezes mais do que uma dieta que só atende às necessidades de energia com
alimentos ricos em amido”, diz Meilland.
Desta forma, a obesidade está aumentando tanto em adultos
quanto em crianças.
As agências especializadas da ONU estimam que, se os padrões
de consumo de alimentos não mudarem, seu impacto nos custos diretos de
assistência médica e na perda de produtividade econômica deve atingir 1,3
trilhão de dólares por ano até 2030.
Fonte: AFP – Agence France-Presse.