Quero começar dizendo que um sermão expositivo não é pegar uma passagem da Bíblia e explicar o significado de cada versículo e de cada palavra importante que vamos encontrando no caminho. Quando isso acontece, o pregador deixa de ser um expoente da Palavra para se transformar em uma espécie de comentário bíblico ambulante. Também não é usar o púlpito para dar uma aula seca e pouco fértil de interpretação bíblica que deixa os ouvintes confusos e irritados, tentando discernir qual é a mensagem de Deus para eles. Pregar é proclamar uma mensagem que extraímos das Escrituras por meio de um trabalho árduo e que transmitimos pela pregação, buscando a glória de Deus em Cristo e o proveito espiritual de nossos ouvintes.
Voltemos, então, à nossa pergunta inicial: O que é um sermão expositivo? Dito de maneira simples e concisa, é o tipo de sermão que ajuda os ouvintes a entender o significado do texto bíblico e o que Deus quer que façamos à luz do que esse texto ensina. Mark Dever define como o tipo de pregação “em que o ponto principal do texto bíblico que está sendo ensinado vem a ser o ponto principal do sermão pregado” (tradução do autor). O teólogo britânico J.I. Packer define com as seguintes palavras: “A pregação cristã é a atividade em que Deus mesmo, através de um porta-voz, traz a uma audiência uma mensagem de instrução e direção acerca de Cristo, tendo impacto em suas vidas, e que está baseada nas Escrituras” (traduzido pelo autor). A minha definição é: Um sermão expositivo é aquele que expõe e aplica o verdadeiro significado do texto bíblico, levando em consideração seu contexto imediato, assim como o contexto mais amplo da história da redenção, que gira em torno da pessoa e da obra de Cristo, com o propósito de que o ouvinte ouça a voz de Deus através da exposição e de que seja transformado.
Um dos documentos da Assembleia de Westminster (1645) declara que “o pregador deve ser um instrumento com relação ao texto, abrindo-o e aplicando-o como Palavra de Deus aos seus ouvintes (…) para que o texto possa falar (…) e ser ouvido, elaborando cada ponto do texto de tal forma que a sua audiência possa discernir a voz de Deus”. Em outras palavras, o pregador expõe; não impõe. Como diz o teólogo escocês Sinclair Ferguson, “o pregador cria o sermão, mas não cria a mensagem. Ele proclama e explica a mensagem que recebeu” (traduzido pelo autor). Paulo coloca as coisas da seguinte forma em 2Coríntios 4.1-2:
Pelo que, tendo este ministério, segundo a misericórdia que nos foi feita, não desfalecemos; pelo contrário, rejeitamos as coisas que, por vergonhosas, se ocultam, não andando com astúcia, nem adulterando a palavra de Deus; antes, nos recomendamos à consciência de todo homem, na presença de Deus, pela manifestação da verdade.
Essa expressão que a Almeida Revista e Atualizada traduz por “manifestação da verdade” é muito mais impactante no original. A ideia que transmite é a de tornar uma coisa amplamente conhecida ao revelá-la com cuidado em cada detalhe. Por causa disso, o pastor australiano Gary Millar afirma que “a chave da pregação é tornar evidente a mensagem do texto. Ajudar as pessoas a vê-lo (…) senti-lo (…) entendê-lo”. E, mais adiante, acrescenta: “Estou totalmente convencido de que o tipo de pregação que muda os corações das pessoas é aquele que permite ao texto falar por si mesmo” (traduzido pelo autor).
Nesse sentido, toda pregação deve ser expositiva; do contrário, deixa de ser pregação. Quer se trate de uma série sobre um livro da Bíblia, versículo por versículo, quer se trate de uma passagem longa ou curta das Escrituras, o que diferencia a pregação expositiva é que ela expõe e aplica o que o texto realmente diz, e não o que o pregador quer que diga. John Stott afirma:
Expor as Escrituras é extrair o que se encontra no texto e deixá-lo ao alcance da vista. O expoente emprega esforço para expor o que parecia estar oculto, confere clareza ao que parecia confuso, desfaz os nós e desmonta o que parecia um assunto difícil. O oposto da exposição é a imposição, ou seja, impor sobre o texto algo que não está incluído nele. O “texto” em questão pode ser um versículo, uma oração gramatical ou ainda uma só palavra. Do mesmo modo, pode tratar-se de um parágrafo, um capítulo ou um livro inteiro. O tamanho do texto não tem importância, desde que seja tirado da Bíblia; o importante é o que vamos fazer com ele. Seja curto ou extenso, nossa responsabilidade como expositores é fazer com que o texto seja exposto de tal modo que transmita uma mensagem clara, simples, exata, de forma pertinente, sem adições, subtrações ou falsificação.
A maioria das pessoas aprecia um bom truque de mágica. Perguntamo-nos como é possível que o mágico tenha tirado um coelho de uma cartola aparentemente vazia. Mas o pregador não é um mágico; é um expositor; ele foi chamado a tirar da cartola (o texto bíblico) um coelho que já está previamente ali (o conteúdo do texto).
O texto dita e controla o que falamos, como bem assinala John Stott. Isso é pregação expositiva ou, para ser mais preciso, isso é pregação! Quando é algo menos que isso, deixa de ser pregação para se transformar em outra coisa. Não se trata tanto de um método, mas de uma convicção. Se realmente cremos que “toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra” (2Tm 3.16-17), porque iríamos querer fazer outra coisa a não ser expor a Bíblia com fidelidade? É possível que você nunca venha a ser um pregador popular fazendo isso, mas lembre-se de que o “êxito” ministerial não é medido pela quantidade de reproduções do seu sermão no YouTube, ou pela quantidade de conferências em que você prega, mas pela fidelidade ao transmitir o que Deus quer nos dizer nas Escrituras. Espero que estas palavras do Senhor Jesus Cristo, em Mateus 24.45-46, ajudem você a seguir adiante com seu trabalho, buscando unicamente a aprovação dele, e não a dos homens: “Quem é, pois, o servo fiel e prudente, a quem o senhor confiou os seus conservos para dar-lhes o sustento a seu tempo? Bem-aventurado aquele servo a quem seu senhor, quando vier, achar fazendo assim”.
*O trecho abaixo foi retirado com permissão do livro Da Parte de Deus na Presença de Deus, de Sugel Michelén, da Editora Fiel.