Procurador da República Deltan Dallagnol / Foto: Reprodução
A igreja frequentada pelo procurador federal Deltan
Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato no MPF-PR (Ministério
Público Federal do Paraná), apoiou e foi sede do Instituto Mude, que hoje
pressiona o STF (Supremo Tribunal Federal) em defesa da operação.
A IBB (Igreja Batista do Bacacheri), em Curitiba, tem 60
anos e cerca de 3.000 fiéis. Além de Dallagnol, o líder do Mude, Flávio
Oliveira, é frequentador do espaço.
Conversas do coordenador da Lava Jato com membros do Mude
foram divulgadas pelo The Intercept Brasil nesta segunda-feira. Segundo
reportagem do The Intercept, o procurador participava de um grupo de Telegram
com integrantes do Mude e sugeria ações ao grupo, que inicialmente era tratado
como um movimento.
Pelo grupo, Dallagnol chegou a pedir que o Mude articulasse
uma campanha em favor da nomeação do procurador Nicolao Dino para a chefia da
PGR (Procuradoria-Geral da República). Também recomendou ao movimento a
divulgação de textos para que a relatoria dos processos da Lava Jato no STF não
ficasse com Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski ou Dias Toffoli, atual
presidente do Supremo.
Nas conversas, Dallagnol pede que não seja citado nas
manifestações. Após suas recomendações, postagens alinhadas às suas sugestões
foram postadas pelo Mude em sua página no Facebook.
O Mude, até hoje, posta mensagens em defesa da operação Lava
Jato. Sua página no Facebook tem mais de 60 mil seguidores.
No sábado, a página compartilhou notícia sobre o STF com a
hashtag #STFNaoBrinqueComALavaJato. Na quarta-feira, o ministro do STF Gilmar
Mendes foi chamado de “um sujeito inescrupuloso” em uma postagem com a hashtag
#TodoApoioALavaJato.
‘Deltan e outros procuradores’
Procurado pelo UOL, Oliveira, do Mude, disse não reconhecer
a autenticidade das conversas divulgadas pelo The Intercept Brasil, assim como
tem feito o MPF-PR desde o início das divulgações dos diálogos. Mesmo assim,
ele confirmou que manteve contato com Dallagnol por mensagens de aplicativo.
“Com ele e com outros procuradores”, disse. “Assim como
conversamos [o Mude] com deputados, senadores, prefeitos, juristas, jornalistas
e outros profissionais.”
Oliveira disse que as conversas são consultas. “Sempre que
surge uma dúvida sobre como desenvolver uma determinada ação, como
incentivá-la, nós buscamos uma consulta com um procurador”, afirmou Oliveira.
“São dúvidas sobre a constitucionalidade de um fato, por exemplo.”
Oliveira não vê problema nessas conversas. Ele disse que o
Mude é uma organização política, mas apartidária. Por isso, diz, o contato com
Dallagnol e seus colegas com o instituto não seria ilegal ou antiético. “O fato
de alguém sugerir alguma coisa não quer dizer que você acate essa sugestão.”
Dallagnol foi inspiração
Segundo Oliveira, o Mude surgiu de uma palestra de
Dallagnol. Ele contou que, após ouvirem o procurador falar de mudanças
legislativas necessárias para o aprimoramento do combate à corrupção, um grupo
de indivíduos, alguns deles fiéis da IBB, resolveu articular uma campanha de
arrecadação de assinaturas em favor da proposta, as chamadas 10 Medidas Contra
a Corrupção.
Isso ocorreu ainda em 2015. Naquela época, o Mude não tinha
sede. Integrantes do movimento, então, passaram a se reunir na IBB.
Segundo a própria igreja, foram “diversas reuniões”
realizadas no espaço. Oliveira afirmou que Dallagnol participou de algumas,
apesar de oficialmente nunca ter integrado o movimento. “Seria errado dizer que
cada cidadão que um dia ajudou o Mude fez parte do movimento”, explicou
Oliveira. “Ele [Dallagnol] ajudou, fez doações, mas nunca fez parte. Nunca
integrou a diretoria.”
Cessão de endereço – Oliveira disse também que, em 2016, o
Mude resolveu se formalizar e se cadastrar junto à Receita Federal. Para isso,
contudo, o movimento precisava de um endereço, o que ele não tinha. “Aí pedimos
para um pastor para que pudéssemos usar o endereço da igreja. Ele aceitou”,
afirmou. “Só não me lembro qual o pastor que autorizou.”
Em novembro de 2016, Dallagnol foi avisado por membros do
Mude no grupo do Telegram que o endereço formal da entidade sairia da IBB. A
mudança ocorreu depois que notícias vincularam o procurador a uma agência de
publicidade contratada pelo Mude para fazer campanha pelas 10 Medidas Contra a
Corrupção.
A IBB confirmou que a mudança ocorreu em 2016. Ressaltou,
porém, que ela ocorreu depois que a igreja entendeu que o Mude deveria buscar
um local para seus encontros.
Segundo a igreja, o fato de seus fiéis participarem do Mude
em nada teve a ver com o fato ela ter acolhido o Mude. “Cedemos nossas
dependências para movimentos que convergem como nossos valores de justiça e
cidadania.”
Oliveira, entretanto, reconheceu que o a proximidade do
movimento com a igreja facilitou na negociação para a utilização do endereço da
IBB.
Ninguém da IBB quis conceder entrevista ao UOL. Por email, a
igreja informou que “sempre atuou na evangelização e em ações de compaixão e
justiça, ética e cidadania” e “apoiou o surgimento de diversos movimentos”. “O
nascimento do MUDE acontece a partir dessa vocação da Igreja Batista do
Bacacheri, assim como já fez no passado com tantos outros movimentos de
desenvolvimento de política e cidadania”, afirmou a IBB.
Oliveira, do Mude, disse que o Mude não tem vinculação
institucional com o IBB nem com a Lava Jato. Segundo ele, há membro da
diretoria do instituto que não fazem parte da IBB. Ele não soube dizer quantos.
Dallagnol publicou em sua conta no Twitter uma mensagem
dizendo que seu diálogo com movimentos sociais “nunca foi segredo”. Ele,
contudo, não reconheceu a autenticidade dos diálogos.
*Fonte: UOL